quinta-feira, 14 de julho de 2011

Último Baile da Noite


"Anamnesis of estivation by Vitaly Alexius Samarin"
Nós iremos preservar cada lágrima que escorrer de tuas veias e, não mais sedento de teu néctar, o mundo festejará. No último baile da noite, na última noite antes do amanhecer eterno, a todos será permitido entregar-se a impiedade sem dor, nem culpa. Já que a iminência do fim está a se revelar num doce afago de uma fêmea acalentando sua cria. E não é a vida uma cria da morte, como a criatura que objetiva a criação, a vida revela seu sentido ao se suprimir. O fim é a única fonte inesgotável de mel, e dele o princípio brota vigoroso como uma videira em terra fértil. Mas ainda estamos em pé, e festejamos o finalmente. Aqueles que seguram a minha mão, aqueles que eu seguro a mão e aqueles que estão além, todos nós derramamos o vinho de nossas eras para que então vazias nossas ânforas sejas transbordadas de seiva. Durante o precipitar dos últimos grãos de areia, enterramo-nos e todo vinagre de nossa alma está a sorver-se para a profundeza do esquecimento. Para que enfim de nossos peitos a eternidade possa germinar, e seu fruto será uma nova nação tão perfeita quanto é a luz da verdade. Mas o ocaso ainda não engoliu a fome primitiva, e o banquete ainda exala seu êxtase. Sobre a mesa debruçamo-nos e nossas bocas ocupadas nada falam, e na cama deitamo-nos e nossos corpos ocupados não dormem. Você pode ouvir nosso sussurro silencioso, pode sentir as súplicas e os clamores por aquilo que incendeiam nossos espíritos e deixa nossos olhos em brasa, por aquilo que colapsa toda a existência em suas mãos e com um sopro reconstitui tudo em plena perfeição. Os últimos acordes já são ouvidos, as luzes já se apagam e o salão se esvazia. Lá fora no horizonte o amanhecer de mil sois expurgando a terra da noite em derradeiro e para o todo sempre, e as cinzas do que éramos são olvidadas quando os ventos da renovação varrem-nas para o nada. E por fim podemos nos erguer pela última vez e com inocência contemplar o infinito.